segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Acesso a justiça? Como assim?

O Ministério da Justiça está preocupado com o acesso dos brasileiros a justiça, afirma a reportagem do Conjur de 24 de Fevereiro de 2013, querendo criar um atlas do mapa do acesso a justiça no país, convocando advogados para advocacia pro bono, bem como falando da morosidade do judiciário, dos muitos litigantes, entre outros.
Num determinado momento, afirma que não é crível não existir o acesso a justiça enquanto temos números expressivos de advogados sendo  empossados a cada ano  e que existe um verdadeiro exército de estudantes, bacharéis e advogados, sendo que a advocacia pro bono pode ser um importante aliado neste sentido.
Divido parte da reportagem debatida:
O governo federal está preocupado com o acesso dos brasileiros à Justiça. No segundo semestre deste ano, com previsão para agosto, o Ministério da Justiça pretende lançar dois novos serviços para ajudar a mapear e resolver o problema: um índice e um atlas de acesso à Justiça. Ainda não há nomes definidos.
As ideias foram apresentadas nesta sexta-feira (22/2), em São Paulo, pelo secretário da Reforma do Judiciário, do MJ, Flávio Crocce Caetano, durante audiência pública organizada pelo Ministério Público Federal para debater a advocacia pro bono no país. O índice de acesso à Justiça, segundo Caetano, será um ranking de como está o acesso da população à Justiça nos estados e nas capitais. Depois, o plano é expandir para as principais cidades.
(…)
Flavio Caetano foi convocado à audiência pública para falar sobre a visão geral do Judiciário brasileiro, já que é sua secretaria a responsável por observar todos os aspectos do Judiciário ao mesmo tempo. O secretário elencou três principais problemas para o Judiciário nacional.
O primeiro é a morosidade — hoje, um processo dura até dez anos para ser concluído. O segundo é a litigiosidade. O CNJ aponta que são 90 milhões de processos em tramitação no Brasil. A conta é que seja um processo para cada dois brasileiros, mas isso não se reflete na prática. Caetano afirma que mais de 50% das ações judiciais em trâmite foram ajuizadas pelos governos federal, estaduais e municipais. Outros 38% dos casos são de empresas do sistema financeiro. Os 12% restantes se dividem entre todos os demais setores do país.
O terceiro problema é o mais grave, e onde se encaixam os novos projetos do MJ: a falta de acesso à Justiça. “É um grande paradoxo, já que somos dos países mais litigantes do mundo, mas as pessoas não conseguem chegar à Justiça”, analisa. Ele conta que a intenção é construir um “exército” para dar conta do problema.
Segundo os números levados pelo secretário ao debate, o Brasil hoje tem 750 mil advogados em exercício. As mais de mil faculdades de Direito do país são responsáveis por 720 mil estudantes. “É um verdadeiro exército que pode ser usado para melhorar o país, e a advocacia pro bono é parte essencial disso. A Defensoria Pública vai participar, inclusive porque é quem a Contituição determina que coordene o antedimento jurídico aos hipossuficientes, mas todos devemos unir esforços e participar.”
Fonte: http://www.conjur.com.br/2013-fev-24/ministerio-justica-criar-exercito-ampliar-acesso-justica

Clap, clap, clap… Palmas, palmas, palmas… Idéias lindas, românticas, cheias de palavras e semântica…
E a realidade do acesso a justiça?
Vamos exemplificar apenas três - APENAS TRÊS - fatores que impedem o acesso a justiça:
1. Aviltamento dos honorários advocatícios;
2. A idéia de que somos litigantes;
3. Alguns pontos dentro do Processo eletrônico;
Vejamos:
1. Aviltamento dos honorários advocatícios
É lindo, belo e poético falar de advocacia pro bono quando ela tem que existir do dinheiro dos outros. Pagamos altos impostos, os MAIORES DO MUNDO a um governo que tem a cara de pau de dizer que é ineficiente com o dinheiro que recebe, que não consegue combater a corrupção ou que simplesmente não viu nada… E nós, profissionais liberais honestos, cumpridores de nossos impostos – mesmo sendo estes absurdos – temos que trabalhar de graça para o governo?
Engraçado não é mesmo?
Os judiciário – que faz parte do poder público – cada vez mais demonstra exemplos de maltratar, de tentar denegrir a imagem profissional do advogado com honorários ridículos para qualquer tipo de trabalhador e tudo isto em nome do famoso “enriquecimento sem causa”…
Neste sentido, os advogados devem se contentar com honorários de 1%, com valores de honorários de R$ 100,00, sem falar na chamada compensação de honorários, o que faz tremer qualquer bom senso de uma criança… Agora, quando não se tem juízes suficientes, quando faltam cartórios e fóruns, a culpa também é do advogado que não quer trabalhar de graça… ?!
A ideia da advocacia pro bono é sensacional. Defendo-a. Acredito nela. Mas, contudo, todavia, entretanto, jamais como instrumento de corrigir o acesso a justiça. Quem deve fazer existir este acesso é o governo, não é papel da advocacia. Temos defensores públicos, concursados e com bom salários para tal função mister. A advocacia privada é uma luta árdua de trabalho e de remuneração que deve ser DIGNA!
2. A idéia de que somos litigantes
Põe absurdo esta ideia de que somos litigantes. O Brasil não é um país litigante. É um país que usa pouco o processo judicial. O único ser, instrumento e pessoa que ama um processo judicial e é culpado pela maioria das mazelas de demora do mesmo é o próprio Estado.
Basta ler parte do artigo mencionado, onde o próprio governo afirma isto:
O CNJ aponta que são 90 milhões de processos em tramitação no Brasil. A conta é que seja um processo para cada dois brasileiros, mas isso não se reflete na prática. Caetano afirma que mais de 50% das ações judiciais em trâmite foram ajuizadas pelos governos federal, estaduais e municipais. Outros 38% dos casos são de empresas do sistema financeiro. Os 12% restantes se dividem entre todos os demais setores do país.
Fonte: http://www.conjur.com.br/2013-fev-24/ministerio-justica-criar-exercito-ampliar-acesso-justica
Em bom e claro português: Vamos parar com esta enrolação de que os advogados é que são culpados pela demora da justiça. São apenas 12% que entram efetivamente na justiça. Quiçá um pouco mais, um pouco menos, mas é muito menos do que a maioria. E muito menos para poder afirmar que somos um país litigante.
Não somos litigantes e nem podemos ser, afinal a nossa população pouco sabe sobre seus direitos. A nossa população vê na TV, jornais e outros meios de mídia que o advogado é sem vergonha, corrupto, safado. Como entrar com um ação então, se quem deveria defender seus direitos não presta?
Falta muito ainda para sermos litigantes. E para sermos defensores de nossos direitos mais ainda. E não é o acesso a justiça em si que falta em alguns casos. Falta divulgação, mídia e sensibilização dos direitos das pessoas. Lindo ver na novela as problemáticas de drogas, tráfico e entre outras. Ressalta-se juízes, policiais e outras profissões… E a advocacia, que na Constituição Federal é quem deve administrar a justiça, é sempre acessória e expúria.
Bom refletir sobre isto, para quem assiste novelas e demais programas. Somente o pensamento crítico, trocar de canal, quem sabe seguir a ideia de Groucho Marx ( Acho que a televisão é muito educativa. Todas as vezes que alguém liga o aparelho, vou para a outra sala e leio um livro) pode mudar isto.
3. Alguns pontos dentro do Processo eletrônico
Como muitos sabem, sou da Comissão de Processo Eletrônico da OAB/RS, participo ativamente de vários debates e congressos neste sentido e quero apenas destacar duas situações que REALMENTE IMPEDEM O PROCESSO ELETRÔNICO DE AVANÇAR, entre várias outras que neste artigo não irei mencionar.
3.1. Pagamento de custas pela internet;
Você sabia que todo este papo de virtualização do judiciário cai por terra quando vamos para a prática?
Desde 2009, ou seja, não é recente, o TST vem decidindo em suas Turmas que se o advogado pagar as custas judiciais em um banco oficial mas pela internet NÃO TEM VALIDADE O PAGAMENTO e o recurso não é recebido.
Vamos pensar: Posso peticionar pela internet, posso ver o processo pela internet, o judiciário gasta milhões para fazer propaganda do uso do processo pela internet, mas as custas judiciais não podem ser pagas nos bancos pela internet (isto que somos considerados um dos países mais seguros para acesso a banklines) porque não existe um dígito verificador…
Ora, se houvesse desconfiança da guia juntada, que se mande um ofício para verificar o pagamento. Agora, obrigar em plena era de processo eletrônico o advogado a ir no banco com dinheiro (sim, tem mais isto, pagamento de custas tem que ser em dinheiro!) e depois escanear e juntar a guia no processo é mais do que um contrasenso, é uma ofensa ao acesso a justiça!
3.2. Acesso aos meios do processo eletrônico;
Não estou falando da certificação digital, nem mesmo do curso para conhecer e usar o processo eletrônico. Falo de duas questões elementares: Internet e Luz.
Existem lugares neste Brasil que sequer temos luz. Existe lugares neste Brasil que a luz é pouca, em poucos lugares e ainda usamos lampião a gás. Não é porque a pessoa vive num lugar assim que ela não pode ter acesso a justiça. Além de pouco o governo fazer por estas pessoas ainda irá retirar delas e dos advogados que lá trabalham a possibilidade de viver dignamente e buscar seus direitos?
Observem as reclamações levadas pelas OAB`s de alguns Estados do Norte e Nordeste e vislumbrarão o que digo.
Além disto, podemos ter luz, mas em muitos lugares a internet somente existe no centro da cidade, em uma ou outra casa e de forma muito cara.
Não podemos comparar os grandes centros com os pequenos e jamais ainda com os minúsculos. A internet no Brasil é cara, de baixíssima qualidade e de péssima estabilidade. Quem já viajou ao exterior sabe o que estou falando.
Precisamos pensar bem no que estamos exigindo dos advogados e o que isto reflete aos cidadãos.
Enfim,
Acesso a justiça? Como assim?
Falta muito acesso ainda, falta muito o que se fazer para que este acesso seja de qualidade e realmente acessível. E, quer queiram ou não, a advocacia é fundamental, essencial, quiçá primordial neste quesito.
Parem de menosprezar a advocacia e se aliem a ela.
Nós não queremos nosso espaço ou direitos. Já o temos, está lá na Constituição Federal e nos anais da história deste país e do mundo.
Nós queremos respeito a nossa inteligência e dignidade na nossa profissão, já que juntos -  advocacia, judiciário e Estado – podemos fazer a diferença.
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Artigo escrito por Gustavo Rocha – Sócio da Consultoria GestaoAdvBr
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